Há pouco mais de 2.000 anos…
Ilustração fictícia da Biblioteca de Alexandria destruída em # por um incêndio provocado pelo exército romano. Fonte da imagem < http://www.baltimoreegypt.org/Library.htm
Quando o general e futuro Imperador de Roma, Caio Júlio César, atracou em Alexandria encontrou uma contenda entre irmãos. Cleópatra e Ptolomeu não se entendiam e nem planejavam reinar juntos. Roma, uma das potencias na época, se viu na obrigação de resolver a situação, porém um acordo justo para ambas as partes estava findado ao fracasso. Tendo Cleópatra caído nas graças do general, Ptolomeu armou uma batalha civil contra a sua irmã/rainha/consorte nas ruas da cidade. Os motins e aglomerações resultaram em um dos maiores incêndios criminosos da capital que culminou na destruição do acervo da Biblioteca de Alexandria na qual acreditamos, por meio de relatos, que possuía todos os tipos de pergaminhos sobre os mais variados temas, inclusive o celebre “História do Egito” escrito pelo historiador egípcio Manetho, o criador da lista de faraós que usamos até hoje.
Há pouco mais de uma semana…
L’Institut d’Egypte antes do incêndio. Imagem disponível em < http://cairobserver.com/post/14358165423/destruction-alert-institut-degypte-burned?c98230e8 >. Acesso em 18/12/2011.
Quando os generais do Conselho Supremo das Forças Armadas se posicionaram na liderança do governo provisório do Egito após a queda do presidente/ditador Hosni Mubarak, nem o Exército e nem parte dos civis se entendiam e não mais planejavam trabalhar juntos, assim, semana após semana no Cairo embates entre ambos ocorreram nas ruas da cidade. Os motins e aglomerações resultaram em vários incêndios criminosos e um deles culminou na
destruição do acervo do Institut d’Égypte (Instituto do Egito) no qual sabemos que possuía todos os tipos de manuscritos e livros sobre os mais variados temas, inclusive uma cópia da celebre
Description de l’Egypte escrito por várias mãos e que é considerada a primeira coletânea de artigos científicos acerca da cultura egípcia. Felizmente o original encontra-se na França, mas muitos dos primeiro trabalhos amplos da ciência Egiptologia que arqueólogos, historiadores, artistas e literatos deixaram para nós sucumbiram nas chamas.
Saque no Museu do Iraque.
Ainda que este espaço de milênios separe ambos os incêndios, a semelhança entre as situações é gritante e nos mostram um quadro alarmante: Embora a queima dos arquivos que ocorreu no dia 17/12 tenha sido terrível, não é a primeira vez que insurreições, motins ou batalhas destruíram parte de um patrimônio em institutos, museus, bibliotecas ou reservas técnicas. Lembremos por exemplo dos ataques dos EUA ao Iraque em que durante as ondas de arrastões em 2003 o Museu do Iraque foi parcialmente destruído e muito do que sobrou em ruínas foi saqueado e ainda ronda no mercado negro de peças arqueológicas. Estima-se que mais de 10 mil peças tenham sumido [1]. Um número consideravelmente assombroso, mas que hoje poucos fazem nota. As duas grandes guerras do século XX também foram palcos de destruição tanto do próprio patrimônio arqueológico como o alheio, assim como o de saques como o ocorrido na Etiópia quando as tropas do ditador Benito Mussolini roubaram o Obelisco de Axum em 1937 durante sua invasão ao país [2]. Outros países da Europa seguiram com sua política de saques e o mais bizarro é que é apoiado por uma parcela da população como um ato nobre para poupar os artefatos da destruição em seus países de origem. Isto é tão nobre quanto um estranho tomar uma criança dos braços da mãe alegando que ela não é capaz de cuidar de seu próprio filho por ser uma mulher pobre proveniente do 3º Mundo. Porém se a criança pertence a uma potencial família violenta a coisa se inverte, no entanto, e se temos somente um tio violento e o restante da família é compadecida com a boa educação da criança? Coisa semelhante ocorre com o Institut d’Égypte: temos em foco a imagem de pessoas se vangloriando pela destruição, mas ignoramos ao tempo todo quem passou horas ou dias tentando recuperar algo em meio ao que foi perdido. Assim o dia 17/12 não foi trágico só para a ciência, nem para os adoradores do passado egípcio acomodados em casa colecionando Wallpapers de pirâmides e ignorando o fato de que existem pessoas fazendo propaganda para a destruição do Cine Belas Artes de São Paulo alegando este ser o símbolo de um passado decadente. O dia 17/12 foi trágico também para os egípcios que têm o seu orgulho intelectual ferido a cada sítio arqueológico saqueado, a cada museu invadido e principalmente pela falta do auxilio do governo em fazer o que é necessário para proteger estes lugares. Durante este ano de 2011 vi mais imagens de egípcios chorarem por uma série de artefatos destruídos do que durante todos os meus anos de graduação em Arqueologia vi brasileiros chorarem pela destruição de parques de grafismos rupestres, pelos fósseis retirados do nosso país e vendidos em leilões internacionais ou pelos saques em nossos sítios arqueológicos submersos. Não quero atirar uma pedra em meus conterrâneos, mas estes são os exemplos mais próximos da minha realidade que tenho, porém ao redor do planeta existem atos peculiares de extremo descuido, a destruição do Palácio de Verão na China é um bom apontamento. Posso fazer um mapa de todos os países que dia após dia destruíram e destroem o seu próprio patrimônio arqueológico, porém somente o Egito atualmente é apontado como um mau exemplo. Resta-nos refletir acerca dos motivos
Nenhum comentário:
Postar um comentário